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[GSK] Os tolos e seguros

por Gurusangat Kaur Khalsa


Este final de semana nossas crianças partiram para a Índia, sozinhas!

Há um ano estávamos todos no aeroporto nos despedindo delas com o coração na mão, mas cheios de fé. Foi nossa fé que as motivaram e foi nossa fé que as entregam novamente ao desconhecido. Neste ano, três outras se juntaram aos primeiros quatro rapazes, e eles decidiram seguir por conta própria. Puro destemor!


A jornada destas crianças me fez pensar muito sobre os adultos que não tiveram uma chance como esta. Cada ser humano nasce com um contrato de alma e muitas vezes, se não na maioria, jogamos fora cada precioso momento de existência sem sequer esbarrar numa dúvida importante – para que serve minha vida?


Como momentos de crise são críticos e ninguém gosta de sofrer, organizamos uma maneira de escorregar por entre as ruelas de nossas dores e dúvidas, para aterrissar novamente num suposto território da “alegria de viver". Não é raro ver pessoas envoltas em “muitas coisas” e ter nisto a dose necessária para se anestesiar contra as incisões impiedosas da lâmina de nossa própria consciência.


As crianças brasileiras que estão vivendo esta aventura na Índia estão em busca de realizar seus destinos. A Escola da Índia ou a nossa Escola aqui no Brasil não é, em hipóteses alguma, o destino delas, como alguns apressadamente podem pensar. O destino delas está escrito em cada uma de suas testas, e deve ser decifrado por elas e isso requer treino. A Escola Miri Piri é apenas o meio pelo qual esse trabalho pode ser feito. Seria tolice pensar que a Índia seria o destino. Não, é o meio.


São poucas as crianças que podem ter o privilégio de obter, ao alcance de suas mãos, o modelo de educação de Miri Piri como meio. Nesta Escola, as crianças são treinadas para se identificarem, se conhecerem e se projetarem sem medo de serem quem são. Elas são treinadas para não temerem suas dúvidas e, nem tampouco, se prenderem a elas. Meios lhes são dados para que elas alcancem uma profunda relação entre suas vidas e o mundo cheio de contradição e arestas que lhes acolheu. Estes meios lhes possibilitam viver de forma responsável e criativa, sem medo do amanhã e também lhes servem para se libertarem do jogos de sedução na busca de segurança e aceitação. Estas crianças aprendem a se valorizar além do corpo. Elas aprendem a valorizar o corpo como meio de expressão da força de seu espírito. Elas aprendem que seus valores precisam ser vividos e colocados em prática para que haja paz e justiça no mundo. Mas isso não acontece se elas não aprenderem a olhar para o lado, radialmente, e reconhecerem o seu entorno e agirem nele. Elas aprendem a arte de estabelecer e usar seu espaço sagrado para se projetarem a partir dele de forma única, radiante e efetiva no mundo. Elas se tornam serem humanos concretos, e não tolos e fúteis mamíferos em busca de conforto e segurança fácil. Pessoas medrosas que desperdiçam suas vidas buscando segurança em formas rotas de relacionamentos, os quais moldam identidades cindidas, preconceituosas, que projetam dúvida na liberdade do outro.


Nossas crianças atravessaram mares e terras distantes para se assentarem soberanas na propriedade do Guru Ram Das. Elas foram abençoadas com uma estrela na testa. Elas não serão poupadas do confronto, pois elas colecionam seus pequenos traumas, muitos deles herança da inconsistência de uma sociedade de adultos infantis, comocionais e frágeis. Mas, neste confronto reside a lição maior de suas vidas, e sabendo que elas estarão protegidas e cuidadas, me sinto aliviada. Elas estarão no amor e no valor de professores que sabem que têm nas mãos a vida do futuro. Elas estão amparadas, porque terão em mãos os Ensinamentos de Mestres que reconhecem que o destino de cada ser humano é único e cada ser humano é soberanos para retraçá-lo e percorrê-lo.


O traço do destino é uma matéria do currículo de cada aula de Miri Piri. Vocês sabiam que o traço do destino está presente no exercício diário das crianças, fora e dentro da sala de aula? Sabe por que? Porque a vida fora da escola não escolhe lugar para testar seu conhecimento acerca de seu destino. Porque não existe outra escolha para quem quer ser feliz a não ser caminhar, com as próprias pernas, o caminho escolhido pela sua própria consciência.


O que será o futuro destas crianças? Não podemos dizer. Mas, seja lá o que for, precisamos garantir agora que elas tenham tudo que precisam para traça-lo. O mais importante é lhes garantir que aprendam a serem fortes e claras para distinguir o certo do errado, sábias para colocarem em prática aquilo que sua experiência lhes ensinou, e divinas para discernirem o caminho extraordinário do ordinário, e seguirem com suas vidas de forma a fazerem sentido para si.


Assim, elas poderão evitar cair na armadilha surrada do mundo dos adultos, que para se sentirem seguros precisaram abrir mão de sua originalidade e acabaram se tornando tolos. Os tolos e seguros. Quanto tempo ainda este mundo se sustenta nas mãos de adultos tolos e seguros?


Acho que nossas crianças estão nos mostrando muito bem o caminho para sair desta tolice e abraçar a segurança viva de serem elas mesmas, livres, soberanas e maduras.


Wahe Guru, Sat Nam.



Belo Horizonte, 19 de agosto de 2013.


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