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UNIVERSALIDADE

Conduta ética e atemporal

 

por Gurusangat Kaur Khalsa

 

Ontem eu lia o pronunciamento do Primeiro Ministro da Inglaterra, feito de seu gabinete na Downing Street, em Londres, exaltando os pilares do Sikh Dharma, por ocasião da abertura das solenidades oficiais do Baisakhi. Em várias cidades importantes do planeta, políticos renomados estão se juntando com autoridades e pessoas simples do Sikh Dharma, com seus Kirtanees (músicos) e com os professores do Kundalini Yoga para celebrar Baisakhi. Mas, o que é Baisakhi e qual sua importância?

 

Vaisakhi, ou Baisakhi,  corresponde ao segundo mês do calendário Sikh Nanakshahi. Esse mês tem início no dia 13 de abril e finda no dia 14 de maio. Esse período é marcado por inúmeros festivais e celebrações. Os Hindus celebram a vinda de sua Deusa Ganga à Terra com banhos e rituais. Já os Budistas celebram o nascimento, a iluminação e a morte de seu Mestre Buddha Gautama.

 

Esse mês tem uma importância singular para todos que se relacionam direta ou indiretamente com o Sikh Dharma. No Baisakhi de 1699, Guru Gobind Singh, o décimo Professor desta Tradição, convocou todos seus seguidores e alunos para se congregarem em Anandpur no dia 13 de Abril. Foi colocada uma tenda sobre uma pequena colina, lugar hoje conhecido por Keshgarh Sahib, e uma grande multidão vinda de todas as regiões do Continente Indiano se apresentou para ouvir o que seu Professor teria de tão importante para dizer.

 

A primeira fala do Guru veio na forma de uma pergunta: “Quem sou eu para vocês?” E a resposta veio simples: “Você é nosso Professor”. Confirmando esta relação, ele teria perguntado: “E quem são vocês?” A multidão em uníssono respondeu: “Nós somos seus Sikhs (alunos)”.  Após lembrá-los dessa relação sagrada, o Mestre querido e símbolo de justiça e esperança, com uma voz penetrante e convicta disse: “O Professor de vocês hoje quer algo de seus Sikhs”. E a resposta foi vibrante:  “Hukam karo, sache Patshar!” O que quer dizer – "ordene, Verdadeiro Rei!"

 

Ele então firmou sua mão em sua espada e a envergou alto comandando que se apresentasse a ele aquele disposto a sacrificar sua cabeça. O silêncio reinou profundo e imperturbável... Ele pediu uma segunda e uma terceira vez. Finalmente um dos alunos de seu pai se levantou e se entregou. A multidão aterrorizada ouviu apenas o fulgir da lâmina cortando o ar e em seguida a cabeça do até então Daya Ram cair. Com a espada ensanguentada, ele saiu de sua tenda e pediu mais quatro voluntários, os quais certamente teriam o mesmo destino. Apresentaram-se nesta ordem: Himmat, Mohkam, Dharam, Sahib. Cada um deles era de uma casta hindu e formaram os Panj Pyares (Cinco Amados). Seus corpos foram trazidos para fora da tenda e dispostos aos olhos da Sangat. A multidão antes atônita, agora olhava a tudo com intenso interesse. Os cinco estavam majestosamente vestidos com roupas azuis e douradas. O Guru os colocou deitados sobre o chão com suas cabeças apartadas. A seguir, ele colocou as cabeças em corpos diferentes e ordenou que eles se erguessem. Diante da multidão, absolutamente paralisada, os cinco se levantaram e foram batizados pelo próprio Guru. Após o batismo,  Guru Gobind Singh pediu que os cinco o batizassem também. Ao final, Guru Gobind Singh disse a eles e a todos que ali estavam que: “de agora para frente, vocês não pertencem a casta alguma. Nenhum ritual hindu ou muçulmano é necessário, sequer a crença em superstição de qualquer espécie. Vocês devem apenas crer na presença de Deus, que é o mestre e protetor de todos, o criador e o destruidor. Na nossa nova ordem (Ordem Khalsa), o mais inferior de todos se colocará lado a lado com o mais superior. Este é o fim das austeridades e peregrinações e o início de uma vida pura de dono(a) de casa, e vocês devem estar prontos para o chamado do Dharma (justiça). Mulheres e homens devem ser tratados de forma igual em todos os sentidos”.

 

Nesse dia fenomenal, centenas de milhares de mulheres e homens receberam seus novos nomes espirituais e se juntaram à nova Ordem Khalsa, os puros de coração e mente. Até mesmo o jornalista da Corte do Imperador Afegão, colocado no meio da multidão como espião, ao final do dia escreve ao Imperador o que acontecera com os Cinco Amados e, diante dos fatos inacreditáveis, pede demissão de seu cargo e se batiza, servindo longamente ao Guru.

 

A Ordem Khalsa se formou no século XVII com o intuito de criar um Estado livre e soberano, onde todos os seus cidadãos fossem iguais perante a lei, e sobretudo criar um modelo educacional da excelência para que mulheres, homens e crianças tivessem direitos iguais aos estudos e a prosperidade. Para tal, os Khalsas do Guru Gobind Singh, na forma de mulheres guerreiras e homens de fibra, deram suas vidas na luta contra o jugo Mongol de Delhi e a exploração dos senhores feudais indianos, que, combinados, formavam uma barreira absurda que impedia, sob força de vários recursos espúrios, o acesso aos bens e a uma vida digna e honrada.

 

Deixar que todos morressem na ignorância de suas crenças religiosas e submetidos ao absurdo regime de castas era o meio mais natural. Lutar contra este sistema requeria espírito, coragem e esperança, não somente para si ou para aquele momento em si. O olhar dos Khalsas do Guru não se restringia a uma região geopolítica, também não aos seus cidadãos imediatos. Eles miravam o futuro e os cidadãos do mundo. O sacrifício deles constituiu um legado que hoje celebramos e zelamos. Os Guerreiros da Paz deixaram para nosso mundo atual um exemplo de bravura e entrega aos ideais mais nobres da alma humana – compaixão a todos os seres, liberdade de ser e direito à prosperidade. Os Khalsas do Guru não eram de uma religião em particular. Eles abandonaram seus vínculos anteriores para se dedicar à criação de um mundo onde houvesse esperança e paz.

 

Suas vidas entregues a essa causa honram nossas lembranças com suas histórias e feitos. Sobre essa nobre gente, as palavras de quem mais os amou:

 

“All thee battles I have won against tyranny
I have fought with the devoted backing of the people;
Through them only have I been able to bestow gifts,
Through their help I have escaped from harm;
The love and generosity of these Sikhs
Have enriched my heart and home.
Through their grace I have attained all learning;
Through their help in battle I have slain all my enemies.
I was born to serve them, through them I reached eminence.
What would I have been without their kind and ready help?
There are millions of insignificant people like me.
True service is the service of these people.
I am not inclined to serve others of higher caste:
Charity will bear fruit in this and the next world,
If given to such worthy people as these;
All other sacrifices and charities are profitless.
From toe to toe, whatever I call my own,
All I possess and carry, I dedicate to these people”

Guru Gobind Singh Ji.

 

Wahe Guru Ji Ka Khalsa, Wahe Guru Ji Ki Fateh

 

Wahe Guru, Sat Nam.

 

Belo Horizonte,  9 de Abril de  2014.

A FESTA KHALSA

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Ilustração de Kirpa Kaur Sehmi

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