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[GSK] Os dois últimos carrascos na travessia para o triângulo superior

Aula ministrada por Gurusangat Kaur Khalsa no dia 24 maio de 2019


[GSK abre a aula]


Hoje faremos um kriya para aquecimento e outro bem curto, que é o objetivo da aula. O aquecimento nos permitirá construir stamina, que em inglês quer dizer força interna, garra, força de espírito. O segundo kriya é um material para trabalharmos os rins.


Os rins sofrem demais quando sentimos as dores do amor. Não falo da dor do amor romântico, que é uma coisa muito pequena em relação à dor existencial, mas dessa dor à qual estamos submetidos há anos. A dor de quando o sagrado é quebrado e não é restaurado. A dor de ver pessoas e seres que não podem se defender, sejam eles os seres da floresta – as árvores, os animais, os índios – ou os seres da cidade.


O que podemos fazer não traz um resultado imediato, portanto precisamos desenvolver estratégia, resistência, paciência. Isso causa uma dor muito grande. É dessa dor que falo. A dor desse amor. Também a dor de ver os nossos próprios filhos ou os membros da nossa família passando por dificuldades, tormentas, algum momento de grande purificação.


Gostaríamos que essa purificação fosse “pimba!”. Mas ela não é. Gostaríamos de acelerar os processos dolorosos. Mas eles têm sua própria lógica e razões, que nem mesmo a razão compreende. O tempo cósmico é muito difícil de ser compreendido dentro da perspectiva histórica.


O kriya de hoje deixará no corpo uma memória de que processos têm um tempo e de que precisamos lidar com os dissabores de uma maneira muito sábia. Porque se deixarmos que os dissabores sejam maiores do que a nossa capacidade de lidar com eles nós sucumbiremos, verdadeiramente.


Isso tem a ver com a nossa capacidade de aceitar explosões, sejam elas quais forem. Não negar a sua existência e ao mesmo tempo, determinadamente, não desaparecer com elas. Não significa que não saiamos machucados, feridos, perturbados, traumatizados, mas não desaparecemos. Isso é um grau de resiliência muito grande, que o yogi deveria ter. E só conseguimos conquistá-la quando, passando por uma zona de turbulência, de constrição, não perdemos a nossa inteligência superior, essa informação que vem do triângulo superior.


Darei um exemplo. Uma vez eu conversava com um amigo na Índia, e ele tinha pânico de tiros. Estávamos nos anos 90, havia uma guerra com o Paquistão. Nós morávamos na fronteira, ocorria bombardeios o tempo todo. Era uma situação realmente panicante. Um dia lhe disse que a chance de uma pessoa receber um raio na cabeça é de uma em um milhão. Ele retrucou: “Que estatística é essa? É de uma vida inteira ou de um ano? Se for de uma vida inteira está muito bom, estou salvo. Mas se for de um ano não estou!”


Estava claro que ele não tinha perdido a inteligência dele. Ele não estava no pânico o suficiente para perder a inteligência, a capacidade de análise e de medir o risco da situação. É dessa inteligência que falo. A de não sucumbir à dor.


Quando estamos na dor é importante testar de alguma maneira se ainda estamos na realidade. Isso é o triângulo superior. Se fosse apenas o triângulo inferior atuando estaríamos entregues.


Kriya I: To Build Stamina and Spark the Glandular System, do Manual do Proprietário do Corpo Humano


Kriya II: Tonificando os rins, do Manual do Proprietário do Corpo Humano


Afortunadamente teremos crises. A crise é uma chance. Já sabemos disso muito bem. Mas acreditam que numa crise podemos tanto fingir que não estamos na crise, quanto que estamos na crise por demais?


Há dois sentimentos que ainda se erguem quando estamos atravessando esse momento. Tenho a sensação de que funciona assim: “Caramba! Acabei de matar um leão e agora um dragão sopra seu fogo em cima de mim!?”. São resquícios desesperados do ego para voltar para sua zona de segurança – a nulidade e a prepotência.


O sentimento de nulidade é a falta total de identificação com nossa realidade superior e a presença de muita mente negativa. “Eu não dou conta, eu não sei fazer, eu faço muito mal”. O sentimento de nulidade nos pega nesse campo e não nos é possível acessar a sabedoria da mente neutra. O oposto disso é o sentimento de prepotência.


Na crise tudo está desabando. Se não nos tornamos uma luz, estamos restritos ao sentimento de nulidade. Se oscilamos para o oposto, ao sentimento de prepotência. “Isso não tem nada a ver comigo, estou sendo um objeto desse jogo”. É o excesso de identificação consigo, sem nenhuma noção da realidade e com grande pegada da mente positiva. Nos dois casos acontece uma recusa a ver a realidade como ela é.


Quando estamos lá embaixo tem que haver uma saída! Não existe nada onde não haja uma saída. A nulidade e a prepotência são os últimos carrascos da nossa prisão no triângulo inferior. Quando vencemos isso subimos.


Ambas são recursos do arquétipo da vítima, que pode, inclusive, brincar de estar na nulidade e na prepotência num mesmo dia, dependendo de qual é o meio e com quem está se relacionando. Se está se relacionando com alguém que ele sente que pode trazer luz e auxílio, a nulidade fala mais. Se ele sente que a pessoa com quem está relacionando pode julgá-lo, a prepotência fala mais.


É muito fácil fazer esse jogo. E como se gasta energia! Olha o trabalho que dá! É um requinte! Estamos numa situação e pensamos: “está me ameaçando”, então vamos para a prepotência. Ou então: “não está me ameaçando”, e vamos para a nulidade. Quando vencemos esses dois grandes desafios, estamos prontos para subir para o triângulo superior.


Como fazemos isso? É muito simples e difícil ao mesmo tempo: rendendo a nossa cabeça. Declarando ao mundo: “Sim, sou eu! Sim, eu fiz!”


O medo que temos de render a cabeça é o medo que temos de perder o ego, de perder a identidade, de perder tudo que construímos. Mas o que não sabemos é que ao render a cabeça a nossa identidade é preservada. Esse é o grande ensinamento do Guru Tegh Bahadur, o nono guru.


GSK: Nove vez um?

Turma: Nove.


GSK: Nove vezes dois?

Turma: Dezoito.


GSK: Um mais oito?

Turma: nove


GSK: Nove vezes trinta?

Turma: 270.


GSK: Dois mais sete?

Turma: Nove.


GSK: Nove vezes cinco?

Turma: 45


GSK: Somado?

Turma: Nove.


Esse é o milagre do nove. Tudo que é multiplicado por nove dá nove. O nove é a metáfora da rendição da cabeça. Na hora em que entregamos a cabeça a nossa identidade está preservada. Quando fazemos isso subimos igual a um foguete para o ser superior. É uma paz e uma graça. “O culpado sou eu! Eu que fiz a lama, eu que menti, eu que roubei!”. É um alívio, uma graça, um poder.


Aluna: Fico pensando que tem muito risco de cair num lugar como: “Me engulam, esse aqui sou eu, eu falo a verdade mesmo, eu sou assim, esse é o meu jeito!”.


GSK: Esse é o jogo da prepotência. “Sou muito sincero. Não consigo guardar nada para mim porque sou muito sincero.” É curioso, porque na prepotência e na nulidade ainda usamos virtudes e valores para justificar o que fazemos. A sinceridade é um grande valor. Na boca de um prepotente é um grande perigo. A humildade é um grande valor. Nas mãos da nulidade é um grande perigo. Esse é um teste.


Sentimos quando um momento é tenso o suficiente para não termos mais como fugir. O reconhecemos porque estamos literalmente emparedados, encurralados. Esse é o momento em que rendemos a cabeça. Normalmente essa é uma situação que gera no outro grande compaixão, porque a crise já está tão grande que o outro espera que isso aconteça. E quando acontece o outro sente um grande alívio e o perdão é quase automático.


Já rendemos a cabeça. O outro teve compaixão e gratidão pelo ato nobre de rendermos a cabeça e assumirmos responsabilidade. Não há prepotência nem nulidade. Há uma entrega sincera. Quando acessamos o espaço sagrado e somos capazes de nos entregar, há um ambiente de cura completamente aberto. Aquela ou aquelas pessoas envolvidas podem nunca mais querer nos ver. Está certo, tudo bem. Mas o ambiente de restauração do sagrado foi garantido. Falta apenas um último detalhe para fechar isso com chave de ouro: reparar o dano. Chegarmos à pessoa e dizer: “O que é preciso fazer para reparar o que eu fiz?”


Muitos de nós temos nesse momento, ainda, a pata do dragão querendo nos puxar. Vem um sentimento assim: “Acho que sei o que tenho que fazer”. É a prepotência. Ou: “Nada que eu faça pode reparar o dano.” É a nulidade. Esses dois capetas estão ali prontos para nos pegar, se oscilarmos.


Nesse momento devemos perguntar: “O que posso fazer para reparar?”. A outra pessoa pode dizer: “Nada que você faça pode reparar o dano.” Wahe guru! Então não precisamos fazer nada. O sagrado está mantido e não há mais karma. Paga-se o karma e restaura-se o sagrado. Está tudo certo. Mas as grandes figuras da nulidade e da prepotência precisam ainda ser encaradas até os últimos segundos.


Se fazemos isso, começamos a compreender o que a raiva, a avareza e o apego informam ao triângulo superior. Não é nada negativo. Quando transitamos vemos que o negativo não precisa ficar emitindo radiação de negatividade. O negativo pode emitir uma informação de que algo precisa ser resolvido. É diferente. Isso acontece quando transitamos e chegamos nas terras do triângulo superior. O que é negativo e era difícil começa a ser importante e começamos a aprender com aquilo.


"May the long time sun shine upon you..."


[Transcrição: Tarkash Kaur]

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