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A COZINHA DO GURU

Acolhimento e igualdade

Na sangat de Belo Horizonte, o trabalho de seva na cozinha é conduzido por Guru Sant Kaur

Uma cozinha gratuita e aberta a todos se assenta no coração dos princípios, valores e ensinamentos do Sikh Dharma. Também conhecido por Guru Ka Langar, ou a cozinha do Guru, o langar é o local que acolhe e alimenta quem quer que chegue até ele. A palavra se refere tanto à refeição quanto ao espaço físico em que ela é compartilhada após o Gurdwara.

 

Por incorporar valores de igualdade, generosidade, comunidade e serviço altruísta, o langar representa o momento em que todos e qualquer um são servidos independente de credo, religião, casta, gênero, cor de pele e posição social. "Essa é a disciplina no Guru Ka Langar: que mesmo um rei e um pedinte se sentam juntos, são servidos e comem a mesma comida, de forma indistinta". Yogi Bhajan

Para a mentalidade indiana do século XVI, organizada e regida por sistema de castas, foi revolucionário o Guru propor que aqueles que visitassem um Gurdwara se assentariam juntos e compartilhariam uma refeição. A criação de langars cumpriu assim o propósito de combater a divisão de classes e a discriminação étnica, servindo de forte alavanca para a elevação igualitária das pessoas.

Seva ou serviço é outro valor de extrema importância nessa tradição e que é exemplarmente incorporado pelo langar. Seva é um ato de humildade e desapego do ego. Seu princípio é a realização de uma ação sem qualquer expectativa de remuneração, compensação ou benefícios pessoais. As provisões, o preparo, o ato de servir e a limpeza envolvidos no langar são atividades realizadas como seva pelos frequentadores do Gurdwara. Praticando a seva, um sikh exalta a criação universal, na medida em que serve indiscriminadamente a cada um que o rodeia, entendendo que a força que cria é uma só e ela pervade a todos os seres humanos.

EK ONG KAR

O princípio de união entre criador e criatura sustentou a formação dos primeiros langars da tradição Sikh. A semente do langar foi lançada em 1481 por Guru Nanak, quando seu pai deu a ele vinte rupias para investir num bom negócio, aconselhando-o de que "um bom negócio nasce de uma boa barganha". Com a missão investida pelo pai, Nanak, então com 12 anos, saiu pela cidade e encontrou em seu caminho alguns sadhus – homens santos que vivem de forma abnegada. Ao ver esses homens famintos, decidiu comprar alguns legumes, cozinhar para eles e alimentá-los. Ao fazer isso, Nanak exemplificou que o verdadeiro bem – ou a verdadeira barganha – é servir ao próximo sem interesses próprios. Um ato de devoção, generosidade e amor.

 

Em 1521, quando Guru Nanak se instalou em Kartarpur, após suas viagens missionárias (udasis), ele estabeleceu os princípios basilares de um Gurdwara, com as ideias de sangat (congregação), shabad, kirtan (entoação de hinos com instrumentos musicais) e langar. Anos depois, Guru Amar Das, o terceiro Guru, formalizou a instituição do langar, tornando mandatório que os visitantes, antes de serem recebidos por ele, deveriam se assentar no chão da cozinha e compartilhar a mesma refeição.

A história conta que o imperador mongol muçulmano Akbar, uma das figuras políticas mais importantes daquela época na Índia, ao visitar Guru Amar Das concordou em sentar-se em comunidade e comer como um homem simples. Akbar teria ficado tão impressionado com a mensagem do Guru que fez uma doação ostensiva, ao que Guru Amar Das teria recusado: "A cozinha do Guru é sustentada por contribuições humildes e voluntárias de seus devotos, não por doações imperiais". Akbar, contudo, insistiu com uma doação, e que foi finalmente aceita quando ambos concordaram que Akbar cederia um terreno aos discípulos de Amar Das, para ajudarem a servir aos necessitados e àqueles que buscam a verdade. Essa terra, entregue aos cuidados de Ramdas e Arjan, posteriormente se tornou a cidade de Amritsar.

A formalização do langar por Amar Das ficou conhecida como pangat sangat. Pangat representa o entendimento de que toda a humanidade é uma família. Em pangat, todos se sentam no chão formando linhas e corredores. Sangat significa a congregação daqueles que se reúnem com o propósito de elevar a consciência, vibrar o nome divino e tornar-se puros de coração e de mente. Uma fala de Guru Amar Das se tornou ditado popular: “pahile pangat pachhe sangat” – em pangat, comemos juntos, em sangat, meditamos juntos.

A participação de Mata Khivi, esposa do Guru Angad, o segundo Guru, foi de fundamental importância na manutenção do langar. Sua dedicação em alimentar e cuidar dos visitantes e peregrinos a tornou conhecida como Mata Khivi Ji Ka Langar. No Siri Guru Granth Sahib, há apenas uma menção ao langar, e essa menção é um hino, escrito pelo poeta Balvand, que homenageia Mata Khivi, esposta do Guru Angad, o segundo Guru, dizendo que “Khivi, a esposa do Guru, é uma mulher nobre, que dá abrigo frondoso, acolhedor a todos. Ela distribui a generosidade do langar do Guru; o kheer – o pudim de arroz e o ghee – é como doce ambrosia" (SGGS, Ang 967).

Ao longo da história dos Guru Sikhs, a cozinha continuou desempenhando papel determinante. Bhai Jetha trazia lenha e água e servia comida no langar hall de Guru Amar Das. Foi por meio de sua humilde devoção que conquistou a confiança de Amar Das e posteriormente se tornou Guru Ram Das, o quarto Guru. Anos depois, Guru Gobind Singh, o décimo Guru, antes de morrer em Nanded, teria recomendado a um de seus discípulo a "manter o langar sempre aberto". Em seu Dasam Granth, escreveu: "Deg tegh jag me dou chalai"; "que o langar (caridade) e a espada (justiça) prevaleçam juntas no mundo".

Yogi Bhajan costumava lembrar que quando um navio aporta, ele lança sua âncora ao mar e que a isso se costuma referir na Índia pela palavra langar. Traçando um paralelo, ele dizia que o langar nos convoca a nos sentarmos e ficarmos estáveis. "A palavra langar tem o tempo do Infinito e ela significa 'fator estabilizador'". "É por isso que chamamos de Guru Ka Langar, o local onde reside a estabilidade da mente. Nós viemos, nos curvamos, cantamos, louvamos a Deus, fazemos kirtans, nos tornamos musicalmente, fisicamente e espiritualmente afinados, nos vestimos elegantemente, fazemos o Ardas e ao final nos assentamos e comemos o Guru Ka Langar. Duas horas de Gurdwara nos conduzem ao momento final de compartilharmos o langar", disse Yogiji num Gurdwara em 1987.

Por representar tantos valores, o preparo do langar se dá em estado de extrema devoção, recitando shabads e mantras. Antes de ser servida, é feita uma oração (Ardas) e a comida é abençoada durante o Gurdwara. Tradicionalmente a comida é vegetariana, simples, saborosa e saudável, incorporando o princípio de ser universal e não ferir valores de qualquer religião, disciplina ou credo.

 

GURPRASAD

Distribuído como uma benção ou graça do Guru ao final da cerimônia de um Gurdwara, o prasad tem em sua composição básica: farinha, ghee e açúcar. Há versões variadas de acordo com as regiões e os costumes dos Gurdwaras. Assim como o langar, o prasad é depositado aos pés do Siri Guru Granth Sahib em tigelas de aço inox e abençoado durante o Ardas. Cinco pessoas são servidas simbolizando os Cinco Amados, ou Panj Pyara, os cinco devotos que deram suas cabeças a Guru Gobind Singh para a formação da fraternidade Khalsa, em 1699. Em seguida, todos as pessoas presentes no Gurdwara são servidas.​

DEVOÇÃO, GENEROSIDADE E AMOR

Gurprasad
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