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[GSK] Fé

por Gurusangat Kaur Khalsa


A maioria dos ocidentais tem uma ideia constituída sobre o conceito de fé. Para a maioria de nós, o significado da fé foi internalizado culturalmente, em especial através da religião, em idade muito precoce e muito antes de nossa escolarização formal. As crianças ouvem seus pais conversando, elas observam como eles se relacionam com a realidade e com a fé, elas percebem suas atitudes e as incorporam e, desta maneira, a introjeção é realizada e a ideia, apreendida.


O filamento cultural a partir do qual o senso comum em torno da fé foi construído nos ensina que a fé é uma questão de crença. Uma atitude estabelecida na esperança de que “Deus virá para resgatar ou salvar a humanidade”. Lembro-me de uma conversa com uma amiga, lá no inicio dos anos 90, em Berlim, sobre o risco de escassez de água no planeta, caso não mudássemos nosso estilo de vida e nossa consciência em relação ao problema. Sua posição foi cheia de fé, a despeito do fato de ela ser ateia assumida. Sua resposta foi divertida: “Eu acho você muito preocupada. Tenho certeza que se isso acontecer, algum cientista nos EUA vai descobrir algo que possibilite trazer a água de algum outro planeta para a Terra”. Ela não estava brincando! Ela realmente acreditava nisso!


O problema da fé como visto em nossa cultura ocidental é que, sutilmente, ela invoca uma atitude de passividade e transferência de responsabilidade, colocando a ação em algum lugar fora de nosso alcance pessoal. E isso é muito perigoso, não dá para negar.


Mas Yogi Bhajan devota grande parte de seus Ensinamentos para transformar o conceito da fé compartilhado entre seus alunos e, consequentemente, mudar a forma como a vivemos e como agimos a partir dela. Ele, mais uma vez, toma emprestado do Sikh Dharma a visão de fé e a transporta para a tecnologia do Kundalini Yoga a fim de ser usada em nossas vidas pessoais.


Nestes sistemas, ao contrário de a fé se alinhar com uma crença, ela se torna uma questão de se ter confiança, e um tipo não banalizado de confiança. Trata-se do sentimento que brota do interior, sem traço algum de dúvida sobre sua divindade, já que Deus habita nenhum outro lugar a não ser dentro de cada um de nós. Neste contexto, não há lugar para uma invocação de crença em algo que você não vê, não tem certeza que existe, mas quer, ou precisa, acreditar que é real. A crença é uma idealização e, por que não, uma fantasia. A confiança é uma edificação que ampara e sustenta.


Ao colocar Deus dentro de cada ser, o Dharma ensina e promove uma experiência de fé sofisticada, onde a unidade Eu-Deus pode agir, fornecendo respostas e formas de evoluir a partir da natureza humana de cada um. A confiança e a realização na certeza desta unidade e, ainda, a força interna e o poder que resultam de tal condição proporcionam, inevitavelmente, uma parceria indispensável para a fé, qual seja, a coragem. No instante em que o estado de destemor é alcançado, você é capaz de ouvir um comando interno, e você se torna então o comandante e o comandado. E quando todos ficam juntos, outra condição vital é adquirida, sem a qual você ficaria desorientado na vida para agir. Neste exato momento, um mecanismo requintado, uma forma de radar interior que poderá te guiar é acessado e você toma posse da sua intuição.


Existe uma singularidade nesta equação da fé. Reconhecê-la como produto de coragem mais intuição é radical e belo. Você deixa de esperar que algo aconteça e que você seja salvo. Você torna-se o ator e, portanto, você toma para si a responsabilidade de agir. Ao fazer algo, você também se liberta da reação em cadeia da culpa e da vitimização. Já imaginou este ganho duplo!


Tanto no Sikh Dharma quanto no Kundalini Yoga, o que se espera do individuo é que haja uma ação divina, o que nem de longe pode ser confundida como uma ação mística. Muito pelo contrário, a ação divina é uma ação inteligente, original e corajosa daquela pessoa que vive a unidade com Deus. A fé, sob este prisma, é profundamente revolucionária e libertadora porque, como explicou tão bem Yogi Bhajan, ela reconhece que o ser humano é a parte conhecida de Deus e que Deus é a parte desconhecida do ser humano.


Era o desejo deste grande Mestre chamado Siri Singh Sahib, conhecido entre seus alunos de Kundalini Yoga como Yogi Bhajan, que estes princípios fossem compartilhados e ensinados e que cada um de nós pudéssemos incorporá-los vividamente, para que o mundo ganhasse em amor, paz e consciência através da nossa ação inteligente, compassiva e destemida.


Wahe Guru, Sat Nam.


Belo Horizonte, 10 de setembro de 2013.


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